Leu porque quis, não me encha o saco.

segunda-feira, maio 31, 2004

Chuva, azia, dor nas costas. Queria que fosse domingo pra eu poder ir lá na Praça da Liberdade fazer massagem com os cegos, comprar coisas do Japão pra cozinha e Tiger Balm porque eu perdi minha mochila com meu vidrinho dentro e aproveitar um dia ao ar livre. E essa chuva me dá vontade de fazer fofo, comer pipoca e ver tv, ficar pendurado no telefone com alguém bem da idéia fraca. E dias chuvosos me lembram cheiro de tatame, de kimono. Outro dia passei na frente do prédio onde ficava a academia Ono ali na Brigadeiro Luiz Antônio e fiquei com saudades de fazer karate. Ou aikido. Pelo cheiro do tatame. E do Noboru, do Pedro, do Chebel, do Dudu, do Magrão. Sexta feira, arrumando o armário, eu achei minha faixa marrom e meu kimono. Amarelei quando ia fazer o exame da faixa preta, eu ia apanhar horrores, não estava afim, não fiz. E eu fazia karate quase todo dia. Às vezes fazia duas aulas por dia, porque eu tinha tempo. E eu fui ficando bom naquilo e dava uma satisfação quando o professor ensinava katas de faixa preta quando eu ainda era faixa verde... é a mesma sensação de quando estou ensaiando e fazemos uma música muito boa ali, na hora. E amanhã o Jonas vai embora e eu já tenho saudades dele agora e eu espero que ele volte logo porque ele é o batera mais legal que já tocou com a gente e ele é o batera mais legal que já tocou com a gente porque ele ainda tem aquela quase inocência de quem tem 20 anos e ele está indo embora pra perder essa inocência e acho que ele tem mesmo que fazer isso porque foi exatamente o que eu fiz quando tinha vinte anos. E até hoje eu me arrependo de ter voltado e não ao mesmo tempo, acho que se eu tivesse ficado lá eu talvez nem estivesse vivo pra escrever isso hoje, o que também não seria de todo ruim. Não sei mais.
Sabe que outro dia eu estava em Brasília, passando o domingo sozinho, tinha que ir pro aeroporto umas cinco da tarde, não tinha hotel, não tinha o que fazer então eu comprei um caderno preto e umas etiquetas redondas laranjas e achei que eu ia escrever tudo aquilo que eu sempre quis escrever então eu sentei ali embaixo da torre da tv e dava pra ver as cumbucas lá longe e a feira hippie estava gritando e um povo tocava berimbau e jogava capoeira e isso me irritou profundamente porque era impossível de se concentrar pra escrever qualquer coisa ali e ainda por cima o sol estava assassino e então eu corri pro shopping center e fingi que eu estava em São Paulo. Tomei sorvete, olhei as vitrines, comprei coisas que eu não precisava e fui pro aeroporto quando deu quatro e meia. Eu odeio avião. Prefiro tratar três canais no mesmo dia que viajar de avião. Eu adoro aquela anestesia que dão na junção do maxilar, acho sexy. Não sei de onde eu inventei de achar essa anestesia sexy, mas desde a primeira vez que eu experimentei eu achei. Se eu tivesse essa anestesia em casa eu aplicava todo dia, aliás vou extrair o ciso mês que vem, já estou ansioso pela picada e pela total falta de sensibilidade. Da última vez que eu tomei essa anestesia eu machuquei a gengiva de tanto passar a unha. Mas voltando ao avião, sempre que eu sento naquela poltroninha desgraçada eu tenho certeza que "é agora, vai dar merda". Daí eu rezo uns pais nossos e umas aves marias, mas sempre tenho o cuidado de nunca rezar a ave maria por último porque desde criança eu tenho essa superstição de que se eu rezar uma ave maria e não rezar mais nada depois eu vou morrer. Então é simples assim, para eu não morrer eu só tenho que rezar uma ave maria e um pai nosso depois. E tenho que me lembrar de passar fio dental antes de dormir, pois o esquecimento do mesmo implicará na minha imediata morte no dia seguinte. Desde pequeno eu tenho certeza disso. Mas ainda no avião, como é que a maioria dos vôos nacionais duram sempre uma hora, uma hora e pouco? Tá, pro Rio é menos, mas pra Curitiba, pra Florianópolis, Porto Alegre, Goiãnia, Brasília... tudo uma hora. Pra Buenos Aires são duas e meia. Não gosto de pensar muito nisso, isso de ficar descobrindo falhas no funcionamento básico da realidade. Programaram direitinho, mas tem umas merdas.
Bem, domingo. Ou oitava feira. E eu não quero mais me sentir um leproso. Então eu decido que gosto do meu emprego, apesar de cada vez mais ele se tornar a minha vida. Bem, pelo menos eu tenho uma. Gosto dela.